Como aproveitar ao máximo o internato médico
Como aproveitar ao máximo o internato médico
Autores: Pedro, Leandro e Fabrizio
Do Blog: raciocinioclinico
Para muitos estudantes de Medicina, esta é a época em que se inicia um período muito esperado: o internato médico. Por anos, aguardam sua chegada para enfim começarem a ser médicos de verdade; mas quando se aproximam do internato, surge muito medo e ansiedade.
“O que teremos que fazer?”
“Como seremos tratados?”
“Como conciliar a aprendizagem com ‘tocar’ serviço?”
Esses são apenas alguns dos questionamentos!
Não quero amedrontar ninguém (bem, talvez um pouquinho…), mas este é realmente um período difícil.
Porém, temos algumas dicas, conselhos e métodos que podem te ajudar. Eles são comprovados pela nossa experiência pessoal, pelo relacionamento com os alunos, por estudos da área de educação e por pesquisas sobre formação profissional.
Neste post, falaremos sobre:
– a novidade do trabalho e como adaptar-se a essa realidade;
– áreas de desenvolvimento pessoal e como coordenar isso;
– organização de tempo e estudo;
– profissionalismo e competências médicas.
No final, você ainda poderá baixar um material excelente com parâmetros para avaliar seu desempenho e crescimento profissional.
Até agora você só estudou. Prepare-se para trabalhar!
Essa transição vai acontecer de maneira gradativa, com uma adaptação lenta e confortável…
NÃO, NÃO VAI!
Em um dia, você vai ser estudante; no dia seguinte, você vai cair de paraquedas no hospital ou ambulatório para trabalhar. E tem mais: você vai responsabilidades e deverá cumprir metas, como qualquer trabalhador normal.
“Mas eu não sei o que fazer!”
Não se preocupe. O serviço de saúde já funciona sem você: os docentes, médicos, residentes, enfermagem sabem o que fazer e estão fazendo. E eles já esperam que você tenha dificuldades no começo. (Todos têm!)
Siga o fluxo. Pergunte. Chegue mais cedo para não correr riscos. Se for começar por algum estágio mais específico (Ginecologia e Obstetrícia, por exemplo), estude antes coisas da área, como o exame físico ginecológico.
Os três primeiros meses de internato são de adaptação. Depois, as coisas se acalmam e o trabalho começa a fluir melhor. Nesse tempo, adapte-se a ter horários e ordem no trabalho. A partir de agora, você tem metas quase diárias de trabalho: cuidar dos pacientes, evoluir, passar visita, adequar condutas, rever exames, atender consultas e estudar.
Isso causa uma certa pressão, mas não se sinta especial nem oprimido por isso. Repito: essa é a vida de qualquer trabalhador normal! (Com a diferença que você não corre o risco de ser demitido e ainda não precisa pagar suas contas.)
Outro ponto de angústia é a hierarquia. Muitos têm medo de sofrer maus-tratos ou receber broncas. Não é preciso angustiar-se com isso, pois vai acontecer de qualquer modo. Porém, isso não diz respeito à hierarquia, mas antes corresponde às relações humanas, que obviamente não são perfeitas. O ambiente de trabalho é assim: alguns lugares mais, outros menos, mas todos têm suas mazelas.
O que corresponde à hierarquia não é o autoritarismo, é a posição de cada um no fluxo de trabalho. É trabalhar em equipe, que significa:
– saber acatar ordens (na maior parte das vezes, como pedidos educados);
– dar satisfações do seu trabalho;
– reconhecer o papel de cada um (não só da parte médica e enfermagem, mas também dos técnicos administrativos, secretárias, nutricionista, assistente social, limpeza, manutenção, copa etc.);
– comunicar-se bem com todos.
Eu diria que uma das partes mais legais do trabalho é justamente a oportunidade de conhecer e tratar bem as mais diversas pessoas no ambiente. Tenha como meta ser gentil e educado com todos. Pequenos detalhes de convivência são imprescindíveis para ser um bom profissional e ter reconhecimento no trabalho.
“Bom dia”, “obrigado” e “por favor” são sempre bem vindos. Apresente-se sempre e tente lembrar o nome das pessoas. As pessoas se sentem valorizadas quando recebem atenção. Se você ainda não percebeu, irá descobrir que muitos funcionários recebem pouca atenção e muito trabalho: pessoas da limpeza, técnicos de enfermagem, porteiro…
Sua vida não acaba com o internato
Muitos que começam essa jornada acabam por deixar de lado outras atividades e relacionamentos.
NÃO FAÇA ISSO!
É essencial manter o equilíbrio. Comece desde já a organizar-se para ter tempo para outras coisas importantes da vida. É triste ver que muitos médicos, assim como outros profissionais, deixam-se absorver inteiramente pelo trabalho e deixam de lado família, amigos, lazer, cultura.
Mas com um pouco de organização é possível encontrar tempo para isso (talvez, com menos intensidade que antes).
Essa é uma coisa boa de trabalhar: o sujeito tem que desenvolver esperteza e agilidade para conciliar suas atividades. Pense em uma mãe ou pai de família: trabalha, vai ao mercado, cuida dos filhos, atende a mãe, cuida da reforma da casa, é voluntário na igreja, faz sua caminhada…
Tenha uma agenda para não esquecer coisas importantes devido ao cansaço. Ligue para sua família (não só mande mensagem de celular), fale com amigos de infância, visitesua avó. Reserve tempo para exercícios. Ouça música. Mantenha suas leituras. Deixe de lado hábitos bobos e imaturos que fazem você perder muito tempo, e não gaste tempo demais com internet, Facebook, videogames.
Crescimento pessoal, ou “torna-te o que tu és”
Após essa adaptação inicial ao internato, você começará a perceber claramente que está se desenvolvendo como nunca esteve. Se você conseguir organizar seu tempo, será capaz de pensar e refletir nas suas experiências e desenvolvimento.
Veja só quantas aptidões não exclusivas do médico você poderá desenvolver: ordem, pontualidade, paciência, agilidade, determinação, grandeza, fortaleza, resiliência, bondade.
Além disso, a inteligência e a atenção melhorarão. É comum estudantes perguntarem como é que nos lembramos de um nome, do resultado de um exame, da história de um paciente. Simplesmente, é porque precisamos fazer isso! Como nos preocupamos e temos responsabilidade, da necessidade tiramos a virtude.
Foco e ordem para o aprendizado
Para extrair o melhor do internato é preciso estar focado. Procure saber de antemão os temas mais importantes do estágio ou da especialidade em que você vai “rodar” e organize um cronograma de estudos. Aproveite para rever também a semiologia.
*Dica importantíssima: Leia com muita atenção nosso post sobre prática deliberada, nele poderá encontrar dicas valiosas sobre como desenvolver habilidades.
Um ponto importante da aprendizagem no trabalho é saber estudar a partir do que você está vendo na prática. Anote dúvidas que você teve durante a visita ou ao atender algum paciente – e estude! (É bom ter um lugar para anotar).
Outra notícia é que agora você não vai ter tanto tempo livre para estudar. Aprenda a contentar-se com 15 ou 30 minutos de estudo, e tenha sempre algo à mão para ler em algum intervalo.
Cuidando dos pacientes
Esta é a cereja do bolo. Afinal, é para isso que você está estudando: cuidar de pacientes!
Mas sabemos que o ambiente de trabalho e as cobranças de aprendizagem, as preocupações com provas de residência, o cansaço, a falta de suporte e exemplo são fatores que podem minar e enfraquecer seu interesse.
Com o passar do tempo, as habilidades de relação médico-paciente e o interesse legítimo e honesto por cada paciente também devem crescer. Se isso não ocorrer, ou pior, se começa a haver um endurecimento e até um certo cinismo, é sinal que algo não vai bem. Não podemos ser paquidermes e ter a pele grossa. Pelo contrário: é preciso refinar o modo de cuidar e de atender às necessidades dos nossos pacientes.
Reações de defesa; rotular pacientes como“difíceis” com frequência; não ter paciência para explicar (ou fazê-lo de mau gosto) são atitudes não desejadas. Mas se você percebe isso e procura melhorar, beleza!
Falhas nesses aspectos podem originar-se por falta de conhecimento e de prática. Nesse caso, essas atitudes negativas são reativas: um mecanismo de defesa por não saber como agir melhor.
Procure remediar essa carência pedindo orientações ao preceptor sobre como explicar melhor um tratamento ou doença. Esteja junto do médico quando for dar uma má notícia. Enfim, aprenda como fazer melhor para ter segurança.
Tenha uma visão positiva: apaixone-se por cuidar dos pacientes, esteja motivado para ajudar, curta ouvir histórias, tocar e examinar os pacientes. Desenvolva sua bondade e seu lado humanitário. Esses são os melhores antídotos contra qualquer desumanização, e o melhor estímulo para oferecer um cuidado excelente.
Não se esqueça da morte. Você vai vê-la passeando muito pelos corredores, vai temê-la e um dia chorará por causa dela. Tenha sempre alguém para conversar sobre ela – nem que precise mandar uma mensagem para nós, do blog.
Como saber se estou indo bem?
Você já está grandinho e agora no internato ninguém vai pegar na sua mão. Você é o maior responsável pela qualidade da sua formação!
Para facilitar sua vida, disponibilizamos um guia de competências médicas, que você pode baixar e usar. Elaboramos este guia com base nas competênciasdoAccreditationCouncil for Graduate Medical Education e também das Diretrizes Curriculares Nacionais.
Este material serve de parâmetro para você se autoavaliar e saber o que se espera e se deseja de um bom profissional médico.
Sugerimos que use este material para fazer suaautoavaliação mensal, ou no máximo bimestral, e que retire dela alguns pontos (não muitos!) para desenvolver melhor.
Conclusões
O caminho para tornar-se médico não é fácil. Aqueles que acham que qualquer um consegue são os que não veem a dimensão nem o valor de uma formação tão profunda, prolongada e sacrificada quanto a nossa. Apesar das dificuldades, é o melhor momento da faculdade!
Como disse recentemente um aluno: “virar médico é um sofrimento!”
Quem quer passar além do Bojador
Tem que passar além da dor.
Deus ao mar o perigo e o abismo deu,
Mas nele é que espelhou o céu.”
(Fernando Pessoa, Mensagem)
Desejamos tudo de melhor a todos.
Obrigado por nos levar conosco na sua jornada, jovens padawans!.
E que a força esteja com vocês!!!!!
Pedro, Leandro e Fabrizio